Crônicas de uma quase Carrie
Sem coluna em jornal de NY, mais angu molinho, mais mudanças e o mesmo desejo de escrever sobre o cotidiano
Para ler essa nota, tente se manter presente no presente, fazendo uma única coisa por vez com calma e intenção (apenas leia tudo que escrevi com carinho) . Porque aqui estamos na contramão, lembra? Ahhh… um cafezim ou um chazim quentim pode ser uma boa companhia nesse momento. Boa leitura <3
Quero começar dizendo que eu tô feliz com esse novo espaço para colocar os meus textos no mundo. Tô me sentindo um pouco (só um pouco) a Carrie, de Sex and the City, sabe? As vezes eu penso que várias de nós, millennials, sonhávamos em ser escritoras, morar em NY, sair correndo com um copo de café na mão e fazer sinal para um táxi amarelo parar imediatamente (não vai me dizer que só eu sonhava com isso, né? Será? Agora fiquei preocupada rs).

Pensei e rascunhei tantas coisas para essa primeira nota estruturada nas seções que pensei que foi difícil escolher o que colocar nela. O lado bom (tô treinando ver o lado bom de tudo rs) é que já tenho ideias para as próximas. E, no fim, vocês verão que escolhi falar do simples… do cotidiano.
Acho que essa escolha tem a ver com o meu momento atual de redescoberta de que são as coisinhas do dia a dia que fazem a vida valer a pena. Cada dia mais eu tenho valorizado o hoje em toda sua simplicidade. Não quero viver esperando um grande momento. Quero apreciar o ventinho frio que entra assim que eu abro a janela ao acordar às 5:30h agora no outono. Conseguir parar no meio da tarde para um lanche porque a vida é muito curta pra não me permitir isso. Assistir série (ou a novela Vale Tudo rs) com o meu marido após o jantar enquanto eu penso o quanto eu amo a companhia dele e a nossa vida juntos. Tô parecendo piegas demais? Talvez. Mas, vai por mim. Tem sido muito gostoso olhar pra vida desse jeito. Recomendo!
Notas sobre o comer
Quanto de prazer cabe em um prato? Fundo, raso, de sobremesa. Não importa. Tem prazer que não vem da quantidade, principalmente quando falamos de comida.
Eu sei que a nossa tendência é querer comer mais quando algo está muito gostoso. Mas se a gente não presta atenção e deixa o mais virar muito, o prazer vai embora.
Chega aquele desconforto físico - conhecido por todos nós - que mostra que exagerar não é prazeroso e ainda traz arrependimento e culpa. Sentimentos que não precisam fazer morada em nós. Eles podem só chegar pra nos lembrar de aprender com a situação. Aprender que o prazer está mais relacionado com a qualidade e com o como se come do que com a quantidade.
Por isso, respondendo à pergunta do início do texto, quanto de prazer cabe em um prato é variável. Vai depender da qualidade dos ingredientes, da forma de preparo, das preferências da pessoa e até do nível de fome no momento da refeição (já ouviu a frase “a fome é o melhor tempero”? Pois é).
Outro dia mesmo, eu fiz um almoço que não existe unidade de medida capaz de mensurar o prazer que senti com aquela refeição.
Preparei só o que eu amo e estava com muita vontade de comer: arroz branco bem cozido (eu gosto dele quase grudado ou grudado mesmo), feijão batido e grossinho, carne moída com batatinha e molho de tomate, angu molinho. Tudo refogado com azeite, cebola, alho e temperos naturais (cúrcuma no arroz, colorau e páprica defumada na carne moída). Angu, pra mim, é sem tempero. Ahhh... tinha também uma saladinha de alface e tomate. Como eu gosto da comida bem quentinha, geralmente como a salada primeiro, em um bowl potinho à parte. Por isso, ela não apareceu na foto (abaixo). E, aproveitando que eu estava ali na cozinha, vi que uma goiaba estava muito madura e resolvi fazer um suco porque não gosto de comê-la com aquela textura de muito madura, sabe? E pronto. Ali eu tinha um almoço mais que prazeroso.

Uma refeição com essa combinação é MUITO prazerosa pra mim. E, portanto, preciso cuidar da quantidade para não estragar a minha felicidade rs. Mas, pra isso, eu não preciso me prender a regras do tipo “quantas colheres de cada coisa eu deveria comer?”. Eu, grazadeus, não tenho nenhuma condição de saúde que me exija controlar a minha alimentação dessa forma. E, se você também não tem, não deveria fazer isso. A gente pode deixar pra complicar as coisas quando realmente precisar (e se precisar rs). Mas, prestenção, não estou dizendo que não precisa ter nenhum cuidado com o que, como e quanto se come. Só que tem maneiras de fazer isso sem ser no extremo do controle. Pode acreditar (pra quem não sabe, eu sou nutricionista)!
Voltando ao meu almoço … eu apenas me servi com a quantidade que costumo colocar no prato quando estou com um pouco mais de fome (porque fiz tudo na hora e demorei mais que o previsto), comi devagar, mastiguei bem e saboreei cada garfada.
Ao terminar o prato, claro que a minha vontade foi de me servir mais. Mas me dei alguns poucos minutos. Ali, sentada, com o prato vazio à minha frente, respirando calmamente e ainda agradecendo pela refeição gostosa que eu tinha acabado de fazer.
Foi tempo suficiente pra eu perceber que já tinha chegado no ponto confortável da minha saciedade. E que eu poderia comer aquela comida de novo no jantar daquele mesmo dia ou no almoço do dia seguinte. Que eu não precisava comer tudo de uma vez.
Foi só pensar que eu teria mais refeições tão prazerosas quanto aquela pela frente que o impulso de me servir de novo passou. Consegui manter a sensação boa da refeição no pós-refeição também.
Estou te contando isso não porque eu sou um exemplo de pessoa que se alimenta perfeitamente. Até porque isso nem existe. E eu também não quero ser exemplo de nada. Deve ser muito pesado carregar esse rótulo.
Estou te contando para ilustrar algumas coisas (e, quem sabe, te ajudar a desfazer alguns mitos que ainda podem estar rondando por aí):
Arroz, feijão, carne e salada podem ser tão prazerosos quanto chocolate. Só que cada um tem sua hora.
Para ter prazer com uma comida tão simples como essa minha, é importante conhecer as próprias preferências: arroz solto ou grudado? Feijão inteiro ou batido? Carne moída com bastante molho ou mais sequinha? Angu molinho ou mais firme? Tomate em rodela ou picadinho? Todos esses detalhes fazem diferença quando falamos de prazer com uma refeição.
Você não precisa inventar a roda para comer saudável. O básico funciona (e muito!).
Até quem tem uma boa relação com a comida precisa estar presente no momento da refeição e fazer escolhas sobre o que, como e quanto comer.
Para algumas pessoas, parar de comer no ponto de saciedade confortável pode ser muito mais complicado. Questões hormonais, além das comportamentais, podem dificultar. Se você acha que é o seu caso, procure ajuda médica (mas um médico que não seja fora da casinha, pelo amor da deusa).
Espero que essa nota te ajude a pensar de forma mais ampla em quanto prazer tem no seu prato <3
Notas sobre o viver
“A única constante na vida é a mudança”.
Segundo o Google e o Chat GPT, essa frase é do filósofo grego Heráclito de Éfeso, que viveu por volta de 500 a.C. Mas poderia ser o lema da minha vida. Nesses meus quase 40 anos, eu mudei muito. De casa. De cidade. De estado. De profissão. De ideias. De planos. De sonhos. Etc., etc., etc..
Eu até poderia dizer que “eu prefiro ser essa metamorfose ambulante". Mas, na verdade, eu sou essa metamorfose ambulante independente do meu querer. Porque eu acho que, no fundo, no fundo, eu preferia não mudar tanto. Mudar dá um trabalho danado. Às vezes eu me sinto como a lagarta que vira borboleta, sabe? Toda hora me encasulando, trocando de “pele", pra virar uma nova borboleta. E isso, por mais bonito que pareça, cansa. Qualquer mudança cansa tanto quanto uma mudança de casa. E, dessa, eu entendo. Quer ver?
Enquanto morei com meus pais (até os meus 18 anos, antes de ir estudar em outra cidade), mudamos muito de casa. Muito mesmo. Eu sabia o número de mudanças que havíamos feito. Mas, depois, comecei a contabilizar as minhas próprias mudanças de casa e confundi os números rs mas era coisa de mais de 20. Tô falando sério. Me lembro que, na 4a série do ensino fundamental (que eu não faço ideia como se chama hoje em dia rs), mudamos 4 vezes de casa e eu estudei em 3 escolas diferentes. Não foram 4 escolas porque uma das mudanças foi para uma casa na mesma rua da anterior, então não precisávamos mudar de colégio. E, não. Isso não interferiu no meu rendimento escolar (já contei em outros canais - instagram, podcast: se não me segue, me segue lá - que eu fui a criança CDF da turma).
Voltando para as mudanças … me lembro que eu não gostava do processo da mudança em si (alguém gosta? rs). Que trabalhão. Que bagunça. Desde nova, eu ajudava a minha mãe a encaixotar e desencaixotar coisas. E, mesmo sem gostar, fui ficando muito boa nisso. Como dizem por aí: “a prática leva à perfeição” rs
Mas eu gostava muito da sensação de estar em uma casa nova, um quarto novo. Tudo com sons e cheiros novos. Gostava de redescobrir o banal. De ter a chance de olhar as miudezas do dia-a-dia com outros olhos.
Com isso, eu posso dizer que aprendi que tudo na vida tem o lado bom e o lado ruim: pra viver a sensação boa de descobrir uma casa nova, eu precisava suportar o caos da mudança.
E eu até achava divertida essa vida. Mas eu observava com atenção pessoas ao meu redor que tinham outra vida. Como, por exemplo, uma das minhas "tias” (entre aspas porque não era minha tia, mas eu a chamava assim). Desde que se casou, ela vive na mesma casa. Tem a mesma rotina (com pouca alteração a depender do momento de vida). Mal sai de casa. Nunca nem viajou. Nem pra Guarapari que é a praia dos mineiros (rs!). E não é por condição financeira. É porque nunca quis mesmo. Eu acho que ela gosta da mesmice que é a vida dela já que vive do mesmo jeito desde que eu a conheço (uns 30 anos mais ou menos).
Desde nova, eu olhava pra vida dela e pensava que queria uma vida assim. Mas aí eu cresci e virei meu pai e minha mãe kkkkkk como diz aquela belíssima música de Elis Regina: “Ainda somos os mesmos - E vivemos - Como os nossos pais” …. ou ainda aquela outra profunda canção de Renato Russo: "Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo - São crianças como você - O que você vai ser - Quando você crescer”.
Só nos últimos 11 anos, já foram 8 mudanças (a última foi agora no dia 25/05/25). Muitas caixas. Muito estresse. Muita risada. Muitos aprendizados. E muito autoconhecimento. Tanto que, hoje, consigo perceber que eu não seria feliz se eu tivesse a vida daquela minha tia. Não mesmo.
Cada mudança que fizemos estava alinhada com um momento da nossa vida (no plural porque estou falando do meu marido e eu). Cada uma fez muito sentido com o que pensávamos, sentíamos e precisávamos. Algumas não foram tão boas como imaginávamos. Mas aprendemos muito e…. mudamos de novo tentando melhorar. Afinal, “a única constante na vida é a mudança”, né?
Por isso, obrigada pai e mãe por terem me feito desenvolver as habilidades necessárias para realizar uma boa mudança de casa e, por hoje, eu ser essa pessoa que se adapta a novos contextos. Obrigada, marido, por seguir mudando comigo (e nem tô falando só de mudança de casa agora. Afinal, já são quase 16 anos juntos e como mudamos nesses anos) <3
Estou pronta para esse novo capítulo da nossa vida. Nessa casa que tanto sonhamos e tanto estresse no causou durante os 6 infinitos, caóticos e infernais meses de reforma (ufa!) que valeram a pena porque ela ficou linda e a nossa cara <3
O que me nutriu (para além da comida)
Desde o final do ano passado, livros, entrevistas e tudo mais que eu encontro sobre Clarice Lispector é o que tem me nutrido. Tô muito obcecada por ela e tenho uma nova meta: ter (e ler, claro!) todos os livros dela <3

Que escritora, meus amigos! Que mente (caótica? sim… mas qual não é? rs)!
Será que tem mais fãs de Clarice por aí me lendo aqui?
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Chagamos ao fim de mais uma nota <3
Se quiser me contar o que achou, vou adorar ler seu comentário. Prometo que leio tudo com calma (como espero que você tenha lido até aqui). Afinal, voltar a fazer as coisas com calma e intenção pode ser nosso combinado daqui pra frente.
Obrigada por estar aqui.
Um abraço procê e até a próxima nota.
Cibelle Magalhães
Querida, adorei suas notas!
Senti o gosto do angu, com molho de tomate e feijão batido daqui! Essa combinação é como um abraço dos bons né?
Me identifiquei muito com vc sobre quando fala do cansaço de estar sempre mudando (de forma prática ou simbólica), também estou passando por um momento de virada de década que mobiliza muito por aqui. Deus, minha psicóloga e meu diário terapêutico estão de prova hahaha!
De fato o convite “ou empurrão” para a mudança não é bem uma escolha. Talvez pudessemos tentar nos alienar a ela, mas para quem vive com o coração na mão, essa não é uma opção.
Desejo que suas mudanças continuem te levando a novos e valiosos lugares, e que você possa encontrar respiros no caos do processo de “chegar do outro lado” rs
Muita compaixão e paciência para nós! ❤️
Que delícia ler essas palavras... Através delas eu consegui me transportar para vários dos momentos relatados (pq fiz parte das tantas mudanças de casa enquanto morávamos com os nossos pais)... Consegui sentir o gosto dessa comida feita por você (que aliás, é uma das minhas preferidas) e até cantar os versos das músicas enquanto lia. Bonito ver toda a sua transformação entre tantas idas e vindas ao casulo... Gostoso estarmos alinhadas nessa freada da vida - afinal, sabemos o quanto já foi caotico para nós. Que as mudanças sejam um caminho para nos encontrar cada vez melhores e mais leves. Vamos juntas?